Artigo de David Lafuente e Arturo Rodríguez
A Assembleia Municipal de Lisboa (AML) conseguiu impedir o referendo pela habitação, com a conivência nojenta, mas não surpreendente, do PS.
Após o TC ter rejeitado a proposta de referendo, a presidente da AML convidou o MRH a reformular as perguntas. O Movimento Referendo pela Habitação (MRH) submeteu a reformulação duas semanas atrás, e convocou-se para ontem uma sessão extraordinária na AML para o debate e votação da proposta. Porém, a mesa (com maioria do PS e PCP) decidiu cancelar unilateralmente a votação na última da hora, com a sessão já iniciada. Durante este episódio, os apoiantes do MRH na AML foram expulsos pela polícia na sala por terem exprimido a sua justa indignação.
A única justificação que se deu foi a receção, minutos antes do inicio da sessão, de um email do gabinete do presidente da Câmara Municipal, Carlos Moedas (PSD), a dizer que a proposta de referendo reformulada mantinha alguns dos vicios legais indicados pelo acórdão do TC, sem sequer mencionar quais. Agora é um email mal redigido que tem direito de veto sobre uma iniciativa popular com 11 assinaturas? Ou até sobre o funcionamento da Assembleia Municipal?
Este episódio é vergonhoso, mas muito formativo. Desmascarou-se primeiro a direita toda, rejeitando o referendo – ou seja, colocando a sua defesa da propriedade privada por cima do direito dos cidadãos a se expressarem com o seu voto. Desmascarou-se o PCP como um partido cobrarde perante oportunidades para tensionar o sistema. Desmascarou-se depois o TC, mostrando o papel do poder judiciário na defesa da propriedade privada e na contenção das iniciativas democráticas que possam pôr em questão os lucros dos capitalistas e dos especuladores. Agora desmascarou-se o PS, que no início apoiou demagogicamente o MRH para ganhar pontos na pré-campanha eleitoral, mas que depois de o TC se ter pronunciado, recuou, relutante de questionar este atropelo aos direitos democráticos.
O PS demonstra quanto vale o seu “socialismo”. Este é um partido capitalista, cuja retórica vagamente progressista é só um engodo para enganar os seus votantes. Desmascarou-se, em definitivo, todo o regime da democracia burguesa, cujas diferentes instituições só escondem a ditadura do grande capital, que decide todas as questões importantes.
Apesar desta derrota momentânea, só nos resta agradecer o MRH por estas lições tão importantes: foi o seu sucesso ao angariar 11 mil assinaturas, graças à dedicação dos seus ativistas, o que permitiu isto. Agora a luta pelo direito à habitação deve continuar, com a clareza de que este regime burguês e a sua legalidade não são aliados ou ferramentas, mas inimigos ao serviço dos especuladores.
A assembleia popular convocada pelo MRH no dia 8 de Fevereiro será um ensejo importante para discutir esas questões. Desenvolvendo o apoio social que o MRH tem conquistado, enraizando-se nos bairros, explicando porque é que o referendo foi chumbado, é possível avançar, conquistando a habitação sem pedir o permiso de ninguém. Como se dizia no PREC: o nosso destino nas nossas mãos!