Ao longo dos últimos 100 anos, desde que Rosa Luxemburgo popularizou este slogan, em poucas ocasiões terá ele feito tanto sentido e terá sido tão premente como nos nossos dias.
Sabemos que o capitalismo se desenvolve através de ciclos de crescimento económico, entre 7 a 10 anos, que terminam em inevitáveis recessões, apenas para recomeçar tudo de novo. Mas para além destes ciclos económicos breves, existem ainda períodos gerais expansão e depressão.
Assim, não obstante a euforia económica dos anos 20, o tempo entre guerras foi um período geral de depressão e decadência, no qual o capitalismo gerou 2 guerras mundiais, a maior crise económica da sua história e conheceu então o mundo um tempo de exacerbadas lutas de classes que deram origem à revolução russa, mas infelizmente também, como consequência da derrota da classe trabalhadora, à ascensão do fascismo e do nazismo na Itália e na Alemanha.
De igual modo, após a 2ª guerra mundial, o capitalismo conheceu os seus gloriosos 30 anos de expansão e crescimento (entre 1945 e 73) durante os quais os ciclos de crise foram de reduzido impacto e rapidamente ultrapassados.
Ora o período em que vivemos não tem nada em comum com o pós-segunda guerra mundial. Entrámos numa era de profunda instabilidade, convulsões, guerra e, inevitavelmente, revoluções.
A crise do sistema capitalista põe-se em evidência com as rivalidades imperialistas que desembocaram (de modo mais visível e para já!) na guerra na Ucrânia e nas sanções económicas, que estão a fazer ruir um dos pilares do crescimento económico das últimas décadas: a globalização e o comércio mundial. O outro pilar em ruínas, o “crédito barato” com a respetiva expansão fiduciária, já se estava a manifestar com a espiral inflacionária que começou no ano passado.
Note-se que o total das dívidas publicas e privadas passaram de 200% do PIB mundial em 1999 para os 350% nos dias de hoje. Boa parte deste endividamento serviu para insuflar bolhas especulativas, fosse nas bolsas de valores, nas criptomoedas ou no mercado imobiliário. Em todos estes domínios têm-se registado perdas assombrosas, desde a nova iorquina Wall street (índice nasdaq tinha perdido 33& do seu valor no fim de setembro e o Down Jones cerca de 20%), passando pela virtual bitcoin (60% de perda do valor) até à chinesa Evergrande (imobiliário e construção, cujas dívidas ultrapassam os 300 biliões de dólares).
O aumento das taxas de juro e as políticas de austeridade que serão aplicadas provocarão um maremoto de falências entre as famílias, as instituições, as empresas e até entre os países. O tiro de partida foi dado no Sri Lanka: em Julho o governo deixou de ter, pura e simplesmente, dinheiro para poder importar combustível, medicamentos, comida, quanto mais para poder pagar os juros da dívida. O que se seguiu foi o descalabro económico, a revoltas popular e o derrube do governo.
Necessariamente outros países se seguirão.
Dívidas, prejuízos, inflação, perda do poder de compra, queda da produção industrial, instabilidade no comércio mundial, formação de blocos geopolítico-rivais, guerra e Fome!
A fome é a grande e a permanente “epidemia” que assola o mundo.
De acordo com relatórios da ONU, a fome atinge 10% da população mundial. Outros 30% padecem de insegurança alimentar. Estima-se que 1 pessoa morra de fome por segundo. Isso significa que, por ano, quase 8 milhões de seres humanos morrem por inanição.
Muito se fala no “Holodomor” – ou a “Grande Fome” induzida, inspirada e imposta pelas equívocas políticas económicas de Estaline. Estimavas apontam para 3 a 5 milhões de mortos, muitos dos quais na Ucrânia que era na época a mais importante região agrícola da URSS. Foi terrível, sem dúvida, mas que dizer então dos 2 “Holodomores” que o capitalismo induz, inspira, e impõe todos os anos, ano após ano, década após década?
4 em cada 10 seres humanos, 40% da população mundial hoje ou não comeu, não sabe se vai comer amanhã ou, na melhor das hipóteses, não tem o suficiente para comer. Estamos em 2022, não em 1022! Mas quase metade da população humana continua sujeita a condições – não de vida! – mas de sobrevivência digna da idade média!
E não se julgue que isto é uma realidade distante, característica do que pejorativamente é chamado de “terceiro mundo”. Não! Nos Estados Unidos, o país mais rico do mundo, cerca de 12% da população vive abaixo do limiar da pobreza: isto significa 1 em cada 8. Pelo menos 60% da população, 150 milhões de adultos, vive de “paycheck em paycheck”, isto é: de salário em salário, sem poupanças, sem almofadas financeiras, sem uma retaguarda, uma rede, sem um serviço nacional de saúde (sequer!) que os proteja duma doença, dum imprevisto, um infortúnio, um desastre natural… quanto mais duma crise económica, duma debacle financeira, duma bolha especulativa que atingiu os seus limites… Não admira, portanto, que o número de americanos viciados em antidepressivos tenha explodido nos últimos anos, atingindo já 15% da população!
As limitações e iniquidades do capitalismo não têm consequências apenas para vida dos seres humanos, a própria vida e o próprio planeta estão em perigo pela atividade predatória dos recursos, a veracidade obscena por lucros e a indiferença tacanha pelo longo prazo que os capitalistas manifestam.
100 grandes empresas são responsáveis por mais de 70% da emissão de gases de efeito de estufa. De igual modo, o 1% da população mais rica provoca o dobro da emissão de Co2 (dióxido de carbono) do que aquilo que os 50% da população mais pobre do planeta emite para a atmosfera! E já agora, o país que mais resíduos plásticos “produz” são os Estados Unidos. So much for the green agenda prometida por Joe Biden e Bernie Sanders! O capitalismo não é verde e as diferenças de classes estão por toda a parte e atingem todos os domínios.
O papel da classe trabalhadora
Aqui chegados é absolutamente necessário compreender que não haverá uma “crise final do capitalismo”. Pelo contrário! A não ser que seja derrubado, o capitalismo sempre será capaz de superar as suas crises à custa da exploração e da opressão dos trabalhadores e dos povos. Foi através da mais assombrosa, destruidora e mortífera guerra que o capitalismo superou a crise de 1929. Mesmo agora, como planeiam os nossos capitalistas superar a crise inflacionária? Não é através do corte de salários, da austeridade e das restrições financeiras que afetarão milhões de concidadãos no nosso país e na União europeia?
Todos os dias os mass média bombardeiam-nos com a crise e os sacrifícios necessários. Mas os lucros da GALP nos primeiros 9 meses deste ano foram de 608 milhões, correspondendo a um aumento de 86%; Jerónimo Martins (retalho e distribuição alimentar) aumentou os lucros em 29,3%; a NOS (comunicações) aumentou os lucros em 129,9%; o banco Santander-Totta em 123,6% e a Navigator (sector do papel) aumentou os lucros em 136,9%.
… e podíamos continuar! Como dizia Passos Coelho: “a crise é uma oportunidade para o fortalecimento da economia”. De facto! Mas só para a “economia” de alguns, não para a “economia” de todos os outros, isto: das magras economias da esmagadora maioria.
Existem inúmeros conflitos e opressões na nossa sociedade: de género e de orientação sexual, étnicos e culturais, idadistas ou religiosos… Mas a opressão e o conflito básicos, determinantes e irresolúveis são aqueles subjacentes às classes sociais, aos seus interesses contraditórios e à inevitável luta entre elas.
Senão repare-se: os Estados Unidos tiveram um presidente negro, mas o racismo não acabou (longe disso!) na sociedade americana. o Paquistão teve uma mulher primeira-ministra… mas quem se atreve a dizer que o sexismo e o patriarcado acabaram nesse país? Rishi Sunak, de origem indiana, acabou de se tornar primeiro-ministro da antiga potência colonizadora, mas que fará ele pela comunidade asiática na Grã-bretanha? Ou por aqueles que agora imigram como o fizeram os seus pais nos anos 60? Absolutamente nada! Rishi Sunak é um milionário e chefe do Partido Conservador (o tradicional partido da burguesia inglesa) e irá aplicar uma política para estrito benefício da classe dominante inglesa.
De igual modo, seguramente todos nos lembramos das “causas fraturantes” que o Bloco de Esquerda agitou aquando da sua fundação. E não menorizando o significado e o progresso que representaram propostas como a livre interrupção da gravidez, o direito ao casamento gay, a despenalização do consumo de drogas, etc., etc., a verdade é que todas elas puderam ser aceites e acomodadas pela burguesia, ao mesmo tempo que se desregularam as relações laborais neste país, se multiplicava a precariedade, disparava a emigração dos jovens e se atacou as condições de vida de milhões de trabalhadores e pensionistas, ao mesmo tempo que se degradavam e subfinanciavam as prestações sociais e os serviços e públicos.
Mas se foram acomodas e aceites ontem… não significa que continuem a sê-lo amanhã! Veja-se o retrocesso ao direito à interrupção voluntária da gravidez nos Estados Unidos ou na Polónia. Veja-se como o chamado Estado Social está em risco de ser totalmente desmantelado! Sob o capitalismo nenhuma conquista, seja no plano económico, social ou cultural, pode ser dada como garantida e perene. Os capitalistas nunca deixaram, nunca deixarão de explicitar e esclarecer que estão dispostos a sacrificar no altar do seu poder, ambição e fortuna, todas as conquistas económicas, cívicas, culturais e civilizacionais ganhas com a luta, quando não com o sangue, da classe trabalhadora.
E toda a história dos últimos 150 anos o demonstra que só uma classe é verdadeiramente democrática, anti-imperialista e anticapitalista até ao fim: a classe trabalhadora. Não se trata de endeusar os trabalhadores: mas com todas as suas limitações e preconceitos, com toda a apatia e conservadorismo que manifestam em períodos ditos “normais”, em épocas de estabilidade, a verdade, porém, é que só os trabalhadores, pelo seu número, pelo seu peso, pela sua condição, pela posição que ocupam nas relações sociais de produção moderna poderão derrubar o capitalismo e criar uma nova organização económica, social e política na sociedade, aliando-se e liderando outras classes e grupos sociais oprimidos, rumo à emancipação.
Foi assim na Rússia em 1917. Tal como necessariamente será assim no futuro. Contudo e tal como Trostky certa vez afirmou: “a crise da humanidade reduz-se à crise da direção revolucionária”. Que significa isso?
A luta pelo socialismo
Não basta que o capitalismo esteja em crise e demonstre ser incapaz de desenvolver e gerir harmoniosamente as forças produtivas, proporcionando a todos liberdade, dignidade e justiça. Não basta sequer que os trabalhadores estejam dispostos a lutar e sacrificar as suas vidas para mudar a sociedade.
Que faltou em 1936 na revolução espanhola? Compromisso? Coragem? Consciência? Em Julho de 36, não foram os trabalhadores capazes de derrotar os militares golpistas em Madrid, Barcelona, nas principais cidades… e não estiveram eles dispostos durante 3 anos a combater o fascismo de armas nas mãos? Faltou-lhes compromisso? Coragem? Consciência? Ou o que esteve em falta, não terá sido senão uma direção, um partido revolucionário de massas, que fizesse vingar a perspetiva de que para ganhar a guerra era necessário fazer a revolução ao contrário do que diziam os líderes socialistas e comunistas: “primeiro ganhar a guerra, para depois fazer a revolução”? No fim, sabemos que não obstante todo o heroísmo, se perdeu a guerra e a revolução não se cumpriu.
Mas nem precisamos de ir “aqui ao lado”. Veja-se o 25 de Abril! Em 1974 o fascismo caiu como um castelo de cartas: Quando as chaimites do MFA saíram dos quarteis ninguém, nenhuma força, esteve disposta a defender um regime que caiu de podre ao fim de 48 anos. O putsch militar eletrizou as massas que saíram imediatamente para as ruas, transformando um golpe numa revolução popular. Estima-se que, dias depois, no primeiro 1º de Maio, tantos anos proibido, se manifestaram mais de um milhão de trabalhadores!
E neste contexto que fizeram os dirigentes socialistas e comunistas? Aliaram-se à burguesia liberal do PPD e entraram num governo de coligação sob pretexto de assegurarem a transição democrática contra a ameaça fascista. Mas qual ameaça fascista? O regime caíra com estrondo sem que ninguém o defendesse!
Compare-se: que fez Lenin quando chegou à Rússia em 1917? Acaso coligou-se com Kerensky? Porventura tentou chegar a um acordo com a burguesia liberal russa para obstar ao perigo do retorno ao czarismo? Não! Claro que não. Contra a opinião de muitos dos líderes bolcheviques, incluindo Estaline, quando chegou à Rússia Lenin postulou que os bolcheviques seriam a oposição ao governo provisório, oposição tanto à burguesia liberal como à reação czarista. Nas famosas Teses de Abril defendeu que seriam os bolcheviques a cumprir simultaneamente tanto as tarefas democráticas como as tarefas socialistas da revolução, conduzido a classe trabalhadora ao poder, com um programa de classe, métodos de luta independentes e através dos seus órgãos próprios de poder popular: os sovietes.
Mas aqui chegados teremos de abordar a questão: porque tantas vezes sucedeu ao longo da história do movimento operário que as organizações, sindicatos e partidos que os trabalhadores criaram para a sua emancipação, falharam nos momentos decisivos?
Em O Estado e a Revolução, Lenin chamou a atenção para “os elementos de oportunismo” que tinham tomado conta dos partidos socialistas da 2ª Internacional durante as décadas de desenvolvimento relativamente pacífico do capitalismo. Durante o período de 1870 a 1914 houve um período de auge e expansão capitalista com um regular aumento da qualidade e conforto de vida que chegou também às classes trabalhadoras – isto nos países imperialistas mais avançados.
Essa foi a base material para as ilusões reformistas que tomaram conta dos ativistas, dos dirigentes e também do conjunto da classe: paulatinamente os sindicatos e partidos operários iriam tornar-se mais fortes, com mais aderentes, ganhando conquistas aqui e acolá, propondo reformas, pressionando os parlamentos a legislar. Gradual e pacificamente chegar-se-ia ao socialismo. Aliás! Aquele sector mais progressista e esclarecido da burguesia acabaria ele também por aderir às vantagens e méritos do socialismo.
Sabemos como esses sonhos terminaram: num pesadelo de fogo, aço e trincheiras. O deflagrar da primeira guerra mundial provocou a capitulação chauvinista dos partidos socialistas da 2ª internacional que, em cada país, defenderam a guerra de braço dado com as suas burguesias nacionais e os elementos mais reacionários da sociedade. Tudo, claro, em nome dos “direitos humanos”, do “direito internacional” e da “democracia”. Qualquer semelhança com o que hoje se passa em torno da guerra da Ucrânia não é, infelizmente, mera coincidência.
A Grande Guerra primeiro e a revolução russa depois vieram mudar tudo isto. Os bolcheviques inspiraram a criação de novos partidos operários – os partidos comunistas – por todo o mundo, criando a IIIª Internacional que defendia um programa e uma ação revolucionários (como a Iª Internacional) e tinha milhões de aderentes (como a IIª).
Porém, a juventude e inexperiência desses partidos aliados ao peso, prestígio e influência do partido bolchevique, significou que o destino da IIIª Internacional ficou, desde o princípio, selado à evolução e destino da revolução russa que os inspirara.
Ao contrário do que Marx e Engels perspetivaram, a revolução operária não começou por triunfar num dos mais avançados países capitalistas do mundo, mas num país relativamente atrasado onde o proletariado era uma minoria social.
A Rússia era um país económica e culturalmente atrasado que começou por sofrer anos de guerra mundial e, após o triunfo da revolução, passou por anos de guerra civil, intervenção militar estrangeira e boicote internacional. Tudo isto agudizou as dificuldades económicas nos primeiros anos da revolução e reduziu a vida e dinamismo democrático dos sovietes, pelo cansaço, alheamento e necessidade das massas trabalhadoras em de lutar pela subsistência diária, em detrimento da condução política do nova sociedade.
Disto resultou a formação uma burocracia que paulatinamente se foi separando da classe trabalhadora, gerindo em seu nome e em seu lugar as indústrias, as empresas, os serviços, os sovietes, o Estado. Lenine afirmava que a forma de evitar a burocratização era garantir que todos se tornariam burocratas por turno. Dado o atraso da sociedade russa, dado o seu isolamento internacional, dada as vicissitudes da guerra civil e da intervenção estrangeira, não foi possível que “todos fossem burocratas por turno”.
Pelo contrário, a burocracia, os especialistas necessários à administração das indústrias, das empresas e do Estado, foram recrutados entre os antigos servidores do czarismo e cooptados entre os melhores quadros bolcheviques, que começaram a perpetuar-se nos lugares de poder, a separar-se da fiscalização, do controlo, das próprias condições materiais de existência das massas, cada vez mais afastadas da tomada de decisões.
“As condições materiais de existência determinam a consciência social”. A burocracia emergente, cuja condição material progressivamente se separava da existência quotidiana dos trabalhadores que pretendia representar, tinha os seus interesses e desígnios próprios: permanecer na liderança da sociedade e do Estado e recolher o poder, rendimento e prestígio daí decorrentes.
E sob essa perspetiva, valeria a pena arriscar esse poder, esse rendimento e esse prestígio pela revolução mundial? Ou conviria mais à burocracia nascente chegar a um entendimento com a burguesia mundial que permitisse a construção do “socialismo num só país”? E se para isso fosse necessário algumas cedências e concessões… bom, não se fazem omeletes sem se quebrar alguns ovos!
Tal como os reformistas da IIª Internacional pensavam (ou queriam que se pensasse…) que conseguiriam chegar pacificamente ao socialismo através de reformas e debates parlamentares, também os reformistas da IIIª internacional, a nascente burocracia soviética, pensava (ou queria que se pensasse…) que seria capaz de chegar tranquilamente ao socialismo através da planificação da economia estatizada pela revolução de Outubro, a partir dos seus gabinetes e órgão supremos de direção. E tal como os reformistas da IIª Internacional, também os novos reformistas igualmente consideravam que aquele sector mais progressista e esclarecido da burguesia acabaria por aderir às vantagens e méritos do socialismo – daí a política das “Frentes Populares”, isto é: daí a política de alianças com a burguesia “democrática” que tantas e tantas derrotas provocou, da Espanha à Indonésia…
Colaboração de classes, “coexistência pacífica” … claro que nunca deixaram de existir contradições e conflitos entre a burocracia soviética e a burguesia mundial, mas essas fricções foram sempre circunscritas a palcos secundários (veja-se a divisão da europa em esferas de influência após a conferência de Ialta) e, sobretudo, evitando-se uma dinâmica revolucionária e democrática que pudesse contagiar os trabalhadores soviéticos a agir contra os seus usurpadores!
Era, de qualquer modo, possível construir o “socialismo num só país”? Claro que não! Se com o desenvolvimento das forças produtivas no quadro do capitalismo, as estreitas fronteiras do Estado-nação se tornaram num obstáculo ao progresso, como seria possível ponderar a construção do socialismo, um sistema económico e socialmente mais avançado que o capitalismo, dentro do colete-de-forças de um só país – ainda que esse país fosse imenso e tivesse a imensidão de recursos naturais da URSS?
Porém, durante um tempo, a nacionalização dos meios de produção e a planificação económica permitiram à URSS (país atrasado e isolado) um crescimento prodigioso nos anos 30 quando todo o mundo capitalista estava mergulhado na sua maior crise. Foram as novas relações sociais de produção, herdadas de Outubro, que permitiram a derrota do nazi-fascismo. Mesmo após a IIª Guerra Mundial e apesar de toda devastação causada, a URSS rapidamente se reconstruiu, guindando-se à categoria de superpotência, auxiliando o movimento de descolonização, colocando o primeiro homem em órbita.
Todas estas conquistas, todo o trabalho e esforço da classe trabalhadora soviética tinha, contudo, de carregar com o lastro da burocracia. À medida que o desenvolvimento económico exigia uma maior sofisticação e complexidade, o peso-morto da burocracia foi-se manifestando. Sem uma fiscalização, sem um controlo democrático sobre a economia e sobre o Estado, a corrupção, o nepotismo, o desperdício e a ineficiência foram-se agravando e tornando-se entraves ao desenvolvimento económico já de si prejudicado pelos exorbitantes gastos militares e pela irracionalidade das políticas económicas autárcicas ambicionadas por cada burocracia nacional que, no campo do “socialismo real”, tornava cada país na sua própria coutada.
Desde os anos 20 e 30 que Trotsky alertava que, caso a classe trabalhadora não fosse capaz de derrubar a casta burocrática que, mantendo as formas de propriedade herdadas de outubro, usurpara o poder político; chegaria o dia em que a burocracia haveria de querer assenhorear-se planamente do trabalho e dos meios de produção, restaurando o capitalismo e tornando-se na nova classe dominante. Foi o que sucedeu entre 1989 e 91: sem que fosse disparado um tiro, a URSS soçobrou perante o imperialismo americano!
Durante todo um período, malgrado a degeneração burocrática, o estalinismo deteve um grande autoridade e influência. Isso acabou com a queda do muro de Berlim. De igual modo, durante muito tempo, também os social-democratas granjearam grande prestígio porque (pelo menos nos países ocidentais mais desenvolvidos) tinham sido capazes de proporcionar reformas e melhorias palpáveis à classe trabalhadora. Mas também isso acabou: com a crise capitalista vivemos uma era de reformistas, sem reformas, em que as perspetivas que os jovens trabalhadores enfrentam hoje são piores do que aquelas conhecidas pelos seus pais.
Durante todo um período, o apelo de Leon Trotsky para que se construísse uma IVª Internacional capaz de emancipar os trabalhadores do horror capitalista foi abafado, quase silenciado, pela conjuntura e pela correlação de forças. Mas tudo isso mudou! Os líderes reformistas já não têm o ascendente de outrora: o estalinismo colapsou e o capitalismo entrou numa profunda crise, revelando-se incapaz de proporcionar aos trabalhadores as mínimas concessões que permitissem uma relativa paz social…. Pelo contrário: a burguesia tudo fará para que sejam os trabalhadores pagar o preço da sua crise e das suas políticas irresponsáveis!
Socialismo ou barbárie? Os desafios são imensos, os perigos iminentes, mas as tradições, a teoria, as práticas do marxismo revolucionário foram sendo mantidas e transmitidas num inquebrantável fio que percorreu a História. A Hora é decisiva e tempo de cada um de nós tomar partido! A todos convidamos a juntarem-se a nós na construção da Corrente Marxista Internacional, na edificação do futuro, na materialização da nossa libertação coletiva.
“Os proletários nada têm a perder a não ser as suas algemas. Têm um mundo a ganhar. Proletários de todo o mundo uni-vos!”
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