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Nota sobre as Eleições regionais da Madeira

No seguimento da dissolução da Assembleia Regional da Madeira, foram realizadas as segundas eleições no espaço de 8 meses. O anterior governo regional caiu pelas suspeitas de corrupção que abrangem a Câmara Municipal do Funchal e o Governo Regional.

As contagens dos votos dão uma clara vitória à direita, que se incluirmos PSD, Chega, CDS e IL temos 51,9% dos votos (68,8% se incluirmos o JPP). Por outro lado, CDU e BE não elegem nenhum deputado, obtendo menos de 2% dos votos e atrás de partidos como o PAN, IL ou CDS.

O resumo dos resultados apurados apresenta-se do seguinte modo:

Partido% dos votosMandatos
PSD36,119
PS21,311
JPP16,99
Chega9,24
CDS42
Iniciativa Liberal2,61
PAN1,91
CDU1,60
BE1,40

O PSD conseguiu vencer as eleições, mesmo com o seu candidato, Miguel Albuquerque, constituído arguido num processo criminal de corrupção, apesar de estar longe de uma maioria absoluta. É importante salientar que este PSD tem governado a Região Autónoma da Madeira desde 1976, convivendo com um destino offshore na Ilha da Madeira e favorecimento ao capital, enquanto a situação dos trabalhadores se deteriora cada vez mais. Na verdade, a Madeira apresenta a 2ª mais alta taxa de pobreza ou exclusão social do país, logo a seguir aos Açores!

O Juntos Pelo Povo (JPP), partido regional, foi um dos vencedores das eleições, consolidando o terceiro lugar e, possivelmente os quatro mandatos regionais que ganhou conquistou-os ao PSD. Este partido, apesar da sua designação é um partido de matriz ideológica ligada ao liberalismo, como se expressa nos seus princípios e onde observamos a subserviência ao direito à propriedade privada, o papel regulatório atribuído ao Estado, bem como “evitar sempre que possível relações de dependência a subsídios estatais”. Contudo, em relação às eleições de setembro de 2023 este partido conseguiu angariar mais 8.025 votos, que se traduziu num aumento para 9 mandatos regionais (+ 4 face às últimas eleições). O resultado deste partido desfez o mito da inevitabilidade do Chega como terceira força, mas é certo que recebeu parte dos votos de protesto de pessoas que já estão cansadas dos partidos tradicionais.

Quanto ao BE, além de não conseguir recuperar o mandato que perdeu em 2023, perdeu votos (-1124); a CDU, teve o pior resultado desde 2015 e desta vez perdeu o único mandato que ainda possuía na Assembleia Regional (em 2019 já havia perdido um mandato), o que não deixa de ser uma derrota da esquerda, com consequências negativas para a classe trabalhadora.

O papel da esquerda

Estes resultados quando comparados com as eleições de 2019 ou 2023 mostram uma tendência que deveria colocar a liderança do PCP e BE a refletirem sobre o caminho que têm feito e as mudanças que se tornam necessárias. Recordamos que esta análise não é um ataque ao PCP ou BE, mas uma chamada de atenção a que prestem ouvidos à militância que já começa a extrair conclusões sobre a condução dos partidos, especialmente no PCP.

Para a esquerda, sobretudo PCP e BE, estas eleições vêm confirmar um padrão de perda de votos e que se materializa na perda de mandatos, replicando a mesma tendência nacional. É verdade que nas eleições de 2023 houve uma ligeira recuperação de votos, ao ponto de o BE recuperar o mandato perdido em 2019, mas claramente insuficiente ao ponto de podermos afirmar que se tratou de uma recuperação, tanto que agora, ambos, perderam os mandatos.

Julgamos que os resultados das eleições regionais devem ser lidos à luz do contexto político nacional, ainda que não descuidemos que as eleições regionais apresentam dinâmicas próprias. Contudo, no contexto político atual, estes resultados são fruto de uma dinâmica que ultrapassa o plano regional e reflete a situação nacional.

Entendemos que estes resultados não dependem do comportamento hostil dos meios de comunicação ou de um eleitorado que tenha divergido para a direita por coerência ideológica, até mesmo por um certo encantamento pelo populismo. Este tipo de argumento é, na verdade uma desculpa usada, mas com pouca credibilidade que explique satisfatoriamente o que temos vindo a assistir. 

Em primeiro lugar, os comunistas sabem que os meios de comunicação burgueses nunca darão um tratamento favorável a um projeto de sociedade que coloque em causa as relações de poder existentes. Não é, portanto, novidade que os meios de comunicação estão ao serviço dos interesses da burguesia, fazendo sempre o possível para controlar a opinião pública.

Na verdade, estes resultados eleitorais são consequência de escolhas erradas por parte das lideranças, que insistem em apostar num discurso reformista e, sobretudo, economicista, no qual todas as pessoas sabem que não é realizável, seja porque não existe dinheiro ou porque já ninguém acredita que possam realmente fazer o que defendem nos seus programas. Foram estas escolhas que levaram a que hoje, tenhamos governos PSD ao nível nacional e nas regiões autónomas, caraterizados pela sua instabilidade e sem expectativa de alcançarem um ano de governação, além de 50 deputados reacionários que esperam o momento certo para implementar mais um ataque à classe trabalhadora.

Muitos destes eleitores deram um voto de confiança aos partidos da esquerda em 2015, para logo serem traídos. Estes resultados são, obviamente, um reflexo da situação política nacional e, neste contexto, a verdade é que os erros da geringonça e uma certa abertura a novos acordos com o PS, só têm promovido um afastamento e, consequentemente, a uma incapacidade de canalizar a insatisfação generalizada contra o sistema, que é aproveitada por outras forças políticas. 

Num momento em que as condições de vida se agravam, onde se torna cada vez mais evidente que o capitalismo não tem forma de se salvar dos problemas dos quais ele é a causa, onde cada vez mais pessoas estão cansadas de palavras vazias de significado, não só desafiamos a liderança destes partidos a refletirem no caminho que têm trilhado, mas também a colocarem em prática os princípios do marxismo. Não queremos, com este desafio, transmitir a imagem de sermos arrogantes, porque somos conscientes da nossa dimensão. Lançamos, porém, o repto a que escutem os apelos para transformar a sociedade que vem da juventude e de parte da classe trabalhadora.

A força da esquerda não reside nos votos que, como bem lembra Lenine, só serve para escolher quem terá o chicote com o qual se oprimirá os trabalhadores. Os votos são importantes, contudo, a força da esquerda reside na união da classe trabalhadora e da juventude e da sua capacidade de mobilização, conciliando objetivos económicos e políticos, com o fim de criarmos uma sociedade socialista.

Imagem de destaque retirada de et al. Académica da Madeira Diário Eletrónico.

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About Davide Morais Pires (Colectivo marxista)

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