Para um comunista a luta política não se esgota nas eleições – muito pelo contrário. Mas apesar dos vários mecanismos e poderes que tendem a favorecer os partidos da burguesia no pleito eleitoral, seria errado tanto desvalorizar como sobrevalorizar o significado das pugnas eleitorais. Um resultado eleitoral é como uma fotografia que regista o estado de consciência e de ânimo das massas num determinado momento. Essa fotografia pode dar-nos uma imagem mais ou menos nítida, mas nunca será capaz de registar o movimento das coisas, muito menos será capaz de mostrará o filme completo da luta de classes.
Feita a advertência, passemos à análise das eleições regionais da Madeira. Em primeiro lugar é necessário frisar que a coligação PSD/CDS perdeu a maioria absoluta. Em relação às eleições regionais de 2019 houve menos 8 mil votantes e a coligação de direita perdeu 11 mil votos. Praticamente metade dos eleitores inscritos ficaram em casa, aumentado a taxa de abstenção: 46,64%
Apesar das nuances inerentes a umas eleições de carácter regional, estando o governo PS a meio dum mandato e encontrando-se o país a viver uma profunda crise social, é evidente a incapacidade do maior partido da oposição se apresentar como uma alternativa galvanizadora.
O rei vai nu! Este cenário ainda se torna mais gráfico quando se observa que o PS perdeu 10 pontos percentuais em relação às legislativas de 2022 e quase 15% em relação às regionais de 2019! Aliás! António Costa nem meteu os pés na campanha eleitoral para desvalorizar a debacle que se adinhava!
Ainda à direita, a Iniciativa Liberal, apesar de eleger um deputado regional (que provavelmente proporcionará ao PSD a maioria absoluta no parlamento regional) registou um recuou em relação à percentagem e ao número absoluto de votantes para as legislativas de 2022.
No campo da direita, o claro vencedor é o Chega: sobe em percentagem e número de eleitores. Só não consegue o pleno dos seus objetivos porque não conseguiu afirmar-se como a terceira força da Madeira, ao ficar atrás do (na prática) partido regional Juntos Pelo Povo. Ainda assim o Chega obteve 12 mil votos – quase o dobro da soma dos votos da CDU e Bloco de Esquerda. Apesar dos resultados ficarem aquém da bazófia do seu líder, o partido da extrema-direita continua ainda na curva ascendente, tendo obtido mais de 4000 votos em relação às legislativas de 2022. Nas regionais de 2019 obtivera apenas 619 votos, ontem teve 12 mil…
À esquerda a CDU mantém o seu deputado regional, tendo obtido cerca de mais 1100 votos tanto em relação aos resultados das reginais de 2019, como das legislativas de 2022. Em relação ao Bloco de Esquerda, este recupera o seu deputado regional obtendo mais cerca de 1200 votos em relação às eleições de 2019, mas perdendo 1100 votos para as legislativas de 2022. O Livre obteve 913 votos, correspondendo a 0,72% do total.
Apesar de saudarmos os avanços eleitorais tanto do BE como da CDU, estamos longe de partilhar o otimismo dos seus líderes. Com efeito, se o secretário-geral do PCP Paulo Raimundo considera “muito positivo” o resultado obtido, já a coordenadora do BE Mariana Mortágua celebrou o facto de ter “cumprido os dois objetivos”: voltar a ter representação parlamentar e retirar a maioria absoluta ao PSD/CDS.
Infelizmente, a maioria retirada ao PSD/CDS aconteceu não pelo reforço significativo da esquerda, mas pelo crescimento exponencial do Chega e (em menor medida) da Iniquidade Liberal que, somados, passaram de 1% nas regionais de 2019 para 11,5% nas eleições de ontem. O facto de Miguel Albuquerque ter de fazer um acordo com a IL ou Chega não se traduz em nenhum benefício para a classe trabalhadora, pelo contrário: o programa e ação do governo regional serão ainda mais à direita, mais agressivos e reacionários, enquanto os deputados do BE e da CDU permanecerão 4 anos no parlamento regional sem qualquer poder ou influência. A direita, no seu conjunto, passou dos 46% em 2019, para os 49% em 2022 e agora atinge os 54%.
Lénine costumava dizer “só a verdade é revolucionária”. A verdade dos factos é simples: as eleições regionais confirmaram um enorme desgaste do PS, a incapacidade do PSD crescer, a capitalização eleitoral do descontentamento pelo Chega e as vistas curtas dos líderes de esquerda, satisfeitos com mais algumas migalhas eleitorais.
E repetimos: ainda que a luta de classes não se esgote nas eleições, os seus resultados não deixam de sinalizar as mudanças na consciência dos vários protagonistas sociais. Sob este prima, é particularmente frustrante constar que a CDU e o Bloco tenham avançado tão pouco na frente eleitoral, quando vivemos tão grave crise social em Portugal. Essa frustração acaba por materializar-se em taxas de abstenção altíssimas: 1 em cada 2 eleitores nem sequer se dá ao trabalho de votar. E, ainda que de modo distorcido, é bastante lamentável que, no plano eleitoral, o descontentamento com as governações, do PS a nível nacional e do PSD a nível regional, seja capitalizado (por agora) pela extrema-direita.
Isto sucede não pela desdita do destino, mas porque tanto as direções da PCP como o do Bloco continuam a apresentar-se como oposições no quadro do sistema capitalista, com formas de luta “responsáveis” e apresentando propostas “sérias” que tentam mitigar as piores características do sistema, mas não derrubá-lo. E é por isso que, não obstante as importantes lutas sindicais e populares do último ano, esse movimento, essa raiva das massas, não se traduz em resultados eleitorais desses 2 partidos, ainda muito penalizados pela experiência da “geringonça”.
Pelo contrário, ainda que de forma totalmente demagógica, e sendo financiado pela classe dominante e promovido pelos seus média , o Chega com o seu discurso “antissistema” consegue capitalizar o descontentamento de alguns sectores politicamente atrasados.Porquê? Porque o sistema burguês (do qual o Chega faz parte) está efetivamente podre.
Os dirigentes de esquerda têm de tomar nota deste (importante) facto e agir em concordância. Toda a experiência da Geringonça demonstra como as melhores intenções e as mais tímidas reformas rapidamente se esfumam perante a crise capitalista que esmaga a classe trabalhadora numa avalanche de juros altos e inflação.
É preciso unir as várias lutas, defender um programa político de rutura com o sistema e construir uma alternativa socialista, revolucionária, que liberte os trabalhadores da agiotagem da banca da especulação dos patos bravos do imobliário, da ganância das grandes superfícies retalhistas, do pesadelo (enfim) em que vivemos sob o capitalismo, também na ilha da Madeira onde mais de 30% da população vive em probreza ou risco de pobreza e exclusão social. É preciso dar um futuro à juventude e não há futuro no capitalismo!