Artigo de Jonathan Söderberg
Oleksandra Koval, diretora do Instituto do Livro Ucraniano (que faz parte do Ministério da Cultura e Informação política Ucraniana), anunciou que começarão a trabalhar no abate de mais de 100 milhões de chamados “livros de propaganda” das bibliotecas públicas da Ucrânia. Os livros – incluindo as obras de escritores mundialmente reconhecidos como Dostoyevsky e Pushkin – estarão destinados à reciclagem de papel, de acordo com o Ministério.
A primeira leva de abate, que de acordo como os desejos de Oleksandra Koval, deverá estar completa até ao final do ano, irá incidir naquilo que ela descreveu numa entrevista ao Interfax Ukraine como “literatura ideologicamente danosa”, publicada quando a Ucrânia era parte da União soviética, bem como literatura russa com conteúdos ditos “anti ucranianos”. A segunda leva tem como objetivo retirar todos os livros publicados na Rússia desde o colapso da união Soviética: e “estes incluirão diferentes géneros, como livros infantis, romances ou policiais” – explicou Koval.
Depois do tratamento desta literatura “danosa”, as bibliotecas públicas e escolares da Ucrânia ficarão sem cerca de 100 milhões de livros, ou (mais ou menos) metade do total de títulos que atualmente existem, de acordo com as estimativas de Koval.
Mas nem todas as cópias serão destruídas, pois diz Koval: alguns exemplares deverão ser mantidos nas universidades e bibliotecas científicas nas quais os “livros de fadas e romances da era soviética”, serão preservados para “especialistas estudarem as raízes do mal e do totalitarismo”.
A retirada e abate dos livros russos deve ser encarado no contexto de “descomunização” da Ucrânia. Desde 2015 todos os partidos comunistas e respetivos símbolos foram banidos, e a guerra apenas serviu para acelerar a repressão política: o regime de Zelensky, entretanto, baniu mais 11 partidos e colocou todas as estações televisivas sob direto controlo governamental.
Esta não é a primeira vez que, nos últimos anos, livros russos foram banidos pelo governo ucraniano. Em 2015, trinta e oito livros publicados na Rússia foram banidos. Mais livros têm sido acrescentados à lista desde então, incluindo dois do popular e contemporâneo escritor russo de policiais Boris Akunin.
Em 2018, a edição russa do livro “Estalinegrado” pelo historiador britânico Antony Beevor foi banida. Dada a pressão da embaixada britânica, a proibição seria posteriormente levantada. Mas qual foi a razão da proibição? Uma passagem do livro descrevendo o assassinato de 90 crianças judias pela Organização dos Ucranianos Nacionalistas, do qual o colaborador nazi Stepan Bandera foi um líder destacado.
Este é o mesmo Bandera que em 2021 foi honrado pelo Instituto Ucraniano da Memória Nacional através da sua inclusão numa “necrópole virtual” que celebrava importantes figuras históricas – incluindo dos comandantes de batalhões SS (Smovsky Konstantin Avdiyovych, comandante-em-chefe do 118º Batalhão da Schutzmannschaft e Ivan Omelianovycha-Pavlenko, Comandante da 109º Schutzmannschaft) que levaram a cabo pogroms contra judeus! Mas monumentos de Stepan Bandera não se limitaram ao reino virtual. Em anos recentes, diversas estátuas foram erguidas em louvor deste genocida, enquanto as estátuas de Lenin ou Pushkin foram deitadas abaixo. Em Chernihiv, por exemplo, um monumento dedicado à partisan, heroína e mártir antifascista Zoya Kosmodemyanskaya foi demolido.
já a 21 de Maio deste ano, foi divulgada pelas redes e médias sociais uma imagem alegadamente mostrando a destruição e queima de livros de história ucraniana pelas forças russas. Esta imagem recebeu grande notoriedade pela partilha feita pelo embaixador britânico na Ucrânia, bem como pelo ex-primeiro ministro sueco (Carl Bildt) – que, entre outros negócios duvidosos, foi implicado em crimes de guerra no Sudão, como membro do conselho de administração do Lundin Group. Posteriormente, o “fact checking” da France24 que demonstrou que a imagem fora captada num protesto na Crimeia… em 2010!
Em relação ao facto das forças russas se terem envolvido na destruição de livros, a France 24 admitia que, não obstante as denuncias das autoridades ucranianas, tal não fora ainda demonstrado por provas cabais.
Dificilmente será uma novidade que um governo restrinja a liberdade de expressão em tempos de guerra. Mas este ataque é apenas o último duma série de ataques contra o estatuto da língua russa na Ucrânia que ocorrem desde muito antes do início da guerra. Um terço dos ucranianos considera o russo a sua língua nativa. Mas, não obstante, em 2017 uma Lei foi estabelecida determinando que o ucraniano seja a língua usada em todos os níveis de educação, enquanto o russo e outras línguas minoritárias apenas seriam reconhecidas para instrução aos níveis pré-escolar e básico.
Antes da sua eleição em 2019, Zelensky prometeu que aboliria essa lei, mas cedo renunciou às suas promessas. Foi apenas, por conseguinte, a continuação das políticas chauvinistas do regime ucraniano pós-golpe Maidan de 2014, que repetidamente esmagou os direitos democráticos das comunidades russófonas, enquanto glorificava colaboradores nazis e dava rédea solta, durante anos, a gangs fascistas por todo o país.
Este é o mesmo governo que supostamente luta pela “democracia” – uma “luta” pela qual recebe biliões de dólares de apoio dos governos Ocidentais.
Todos os marxistas devem estar do lado da classe operária internacional na oposição a estes ataques do governo ucraniano, na oposição às “lágrimas de crocodilo” choradas pelos imperialistas da NATO, e em oposição à invasão russa.
A guerra apenas trará o horror e o capitalismo apenas trará a guerra. A única escapatória deste beco sem saída é que os trabalhadores de todos os países derrubem os seus tiranos e tomem o poder nas suas mãos através duma revolução socialista mundial!
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