Autor: Jack Halinski-Fitzpatrick
Nos últimos meses, a mídia mundial esteve repleta de notícias sobre uma nova guerra na Europa. De acordo com os serviços de inteligência norte-americanos, a Rússia deslocou mais de 100 mil soldados para a sua fronteira com a Ucrânia. Além disso, ela também está realizando um exercício militar em conjunto com a Bielorrússia. Os EUA e a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) tiveram uma série de conversas com a Rússia, embora nenhuma delas tenha resolvido a situação até agora.
O que Putin fará?
Há muita especulação sobre o que Putin pretende fazer. Primeiramente, precisamos dizer que os avisos sobre uma “iminente invasão russa” que estão sendo repetidos estrondosamente pela mídia ocidental devem ser levados com desconfiança. Essas histórias são feitas pela CIA com a intenção de moldar a opinião pública. Ainda menos críveis são as declarações feitas pelo governo de Zelensky em Kiev, incluindo a ideia de que os russos estão preparando uma provocação para justificar um ataque militar. Essa é uma guerra de propaganda, e deve ser considerada como uma, o que, é claro, também se aplica às declarações públicas de Putin e Sergey Lavrov, ministro das Relações Exteriores da Rússia.
Especialistas ocidentais apontam para um longo artigo que Putin escreveu em julho do ano passado, em que descreve a Rússia e a Ucrânia como sendo “um povo”. Outros apontam para os comentários feitos por Lavrov acusando a Otan de ser um “projeto desenvolvido para tomar o controle de territórios órfãos pelo colapso do Pacto de Varsóvia e da União Soviética” (minha ênfase). Alguns argumentam que tudo isso é uma suposta evidência de que “Putin quer o império de volta”.
O Exército Russo é claramente muito mais superior do que o da Ucrânia, e poderia invadir o país com relativa facilidade, se assim desejasse. O dirigente da inteligência militar ucraniana foi citado dizendo que “não há recursos militares suficientes para repelir um ataque em escala total da Rússia se ele começar sem [contarmos com; NT] o apoio das forças ocidentais”. O mesmo artigo cita Rob Lee, um ex-fuzileiro naval dos EUA, que disse que os mísseis russos podem “aniquilar uma parte significativa do exército ucraniano em menos de uma hora”.
Entretanto, assim como vimos com as invasões norte-americanas do Iraque e do Afeganistão, enquanto uma invasão inicial pode ser alcançada de forma relativamente rápida, manter ou absorver um país é outra questão. Putin teria que considerar o fato de que ele provavelmente teria que enfrentar uma insurreição local, mesmo se uma invasão tivesse sucesso. Diferentes enquetes mostraram que 58% de todos os homens ou um terço de todos os cidadãos estariam dispostos a combater a Rússia se houvesse uma invasão. O The New York Times também citou um comandante ucraniano, Oleksandr Pavlyuk, alegando que o país iria “iniciar uma guerra de guerrilhas” se fosse necessário.
É evidente que uma parcela substancial da população ucraniana rejeitaria uma invasão russa se ela ocorresse. Desde os protestos do Euromaidan em 2014, que levaram à queda do governo Yanukovitch, nós vimos o Estado promovendo um nacionalismo ucraniano reacionário antirrusso e uma ideologia de extrema-direita. O apoio à Otan na Ucrânia aumentou fortemente nos anos seguintes à anexação da Criméia pela Rússia. De acordo com uma recente pesquisa de opinião, cerca de 60% dos ucranianos votariam pelo ingresso na Otan se houvesse um referendo, embora o país esteja dividido geograficamente, com o Oeste e o Centro fortemente à favor, e o Leste e o Sul votando contra por uma margem estreita (com a pesquisa incluindo apenas a região do Donbass que está sob o controle de Kiev). Seria, portanto, improvável que a Rússia conseguisse absorver a Ucrânia à mão armada.
O Dr. Fred Kagan, ex-professor de história militar na Academia Militar dos EUA em West Point, estima que uma ocupação da Ucrânia iria necessitar de um contra-insurgente para cada 20 habitantes. Isso significaria que uma força de 325 mil soldados seria necessária, apenas para manter o controle em Kiev e nas principais cidades do sul e do leste da Ucrânia. Esse não parece ser um custo que Putin esteja disposto a pagar.
O que Putin quer?
A Rússia fez demandas para os EUA e para a Otan, incluindo para se absterem de atividades militares no antigo bloco oriental; não implementarem mísseis em locais próximos o suficiente que possam atingir a Rússia; o fim da expansão oriental da Otan, entre outras coisas.
A mídia ocidental apresentou essas demandas como completamente irracionais, porém isso é pura hipocrisia. Em 1989, o então secretário de Estado dos EUA, James Baker, prometeu que “não haverá expansão da jurisdição da Otan… nem uma polegada ao leste”. Desde então, a Otan se expandiu mil quilômetros ao leste, e ainda prometeu que tanto a Ucrânia quanto a Geórgia se tornarão membros um dia.
Essa é uma aliança militar que a Rússia percebe como sendo uma ameaça. A Ucrânia também é um dos maiores beneficiários de ajuda militar dos EUA, recebendo 2,5 bilhões de dólares desde 2014. Só se pode imaginar a reação do governo norte-americano se o Canadá ou o México se juntassem a uma aliança militar com a Rússia ou a China. Além disso, após terem assinado o Tratado de não proliferação de mísseis nucleares de alcance intermediário (INF) em 1988, os EUA romperam unilateralmente com ele em 2019.
Os EUA reclamam o princípio sagrado de “soberania nacional” e “inviolabilidade das fronteiras”… mas apenas quando cabe aos seus interesses imperialistas. Os EUA são a nação imperialista mais poderosa da Terra, e nunca hesitaram em remover governos e invadir países para defender os interesses de sua própria classe capitalista.
Eles entraram em guerras no Iraque e no Afeganistão, e constantemente invadiram a Rússia. A cercaram com postos militares avançados da Otan, e organizaram “revoluções coloridas” em países como a Geórgia e a Ucrânia, instalando regimes que são amigáveis com o Ocidente. O movimento Euromaidan foi provocado pelo imperialismo alemão e norte-americano. Eles perturbaram o equilíbrio entre a Rússia e o ocidente na Ucrânia através da ameaça de remover a Rússia da economia ucraniana, da qual tem fortes ligações com a Rússia por motivos históricos.
Putin, defendendo os interesses da classe capitalista russa, certamente quer fazer a Otan recuar. A guerra na Geórgia em 2008 foi um ponto de virada nesse sentido. Após vários anos de humilhação nas mãos dos imperialistas ocidentais, a Rússia disse “basta”. Os EUA puderam fazer pouco para impedir isso.
O mesmo ocorreu em 2013, com as então chamadas “linhas vermelhas” de Obama na Síria. Naquele caso, o Ocidente estava no meio de uma campanha para impulsionar uma insurgência islâmica com o objetivo de derrubar Assad, que era um aliado de longa data da Rússia. Logo se tornou claro, contudo, que os EUA não estavam preparados para mandar tropas terrestres para terminar o serviço. Os russos, portanto, perceberam que era seguro intervir para sustentar o regime de Assad e manter a única instalação militar russa no Mediterrâneo. Os EUA não puderam fazer nada além de assistir a Rússia e o Irã esmagando seus representantes jihadistas na Síria.
Isso foi seguido logo após pela anexação da Criméia em 2014, que também teve um valor histórico e uma importância estratégica para a classe dominante russa. Washington protestou e ameaçou Putin com consequências. Sanções foram impostas, porém o fato é que, oito anos depois, a Criméia permanece sendo parte da Federação Russa, e tem muito pouco que os EUA podem fazer sobre isso.
Tudo isso alimentou a confiança de Putin, e impulsionou suas ambições em reafirmar a Rússia como o principal poder regional na Europa Oriental e na Ásia Central. Isso foi ainda mais reforçado após ele intervir para manter os regimes na Bielorrússia e no Cazaquistão, aumentando a dependência de ambos os países com a Rússia.
Na sequência da derrota dos EUA no Afeganistão, Putin acredita que mais uma vez chegou o momento certo para reafirmar os interesses do capitalismo russo e fazer o Ocidente recuar. Em um estilo tipicamente gangster, ele usa de ameaças a nível mundial para ganhar vantagem. O portal Politico afirma que, em novembro, Putin disse a diplomatas que um certo nível de tensão iria forçar o ocidente a levar a Rússia a sério. Deslocar um grande número de tropas para a fronteira ucraniana é uma estratégia projetada para alcançar exatamente isso.
Agora, já existem especulações que um ataque cibernético que derrubou 70 websites do governo ucraniano foi realizado sob instruções de Putin. A Rússia também realizou exercícios de tiro ao vivo com tropas e tanques enquanto as conversas estavam ocorrendo, e tem agora notícias de mais exercícios na Bielorrússia. Putin pretende ameaçar a Ucrânia para forçar os EUA e a Otan a sentarem na mesa de negociações para discutir uma retirada da Otan da Europa Ocidental, e a implementação dos acordos de Minsk (o acordo de paz assinado com a Ucrânia sobre o status de suas regiões orientais, o que consolidaria a influência russa dentro do país).
Enquanto uma ocupação em escala total está fora de questão, as ameaças de Putin não são totalmente vazias. É possível que a Rússia lance uma “pequena guerra” ou um ataque cirúrgico contra instalações militares ucranianas. Comentaristas ocidentais dizem que isso pode envolver uma anexação completa da região do Donbass, que já é controlada por forças pró-russas atualmente; criando um corredor terrestre ligado a já anteriormente anexada Criméia; ou um renascimento do então chamado projeto “Nova Rússia”, que iria envolver uma tentativa de “retirar a Ucrânia do Mar Negro”.
Contudo, parece improvável que Putin desejaria anexar o Donbass. Deixando essas regiões no seu estado atual – efetivamente controladas pela Rússia, porém continuando como parte da Ucrânia – dá ao Putin um bom ponto de barganha no país. Igualmente, o projeto “Nova Rússia” envolveria anexar a cidade de Odessa, uma cidade com mais de um milhão de pessoas, 68% deles sendo etnicamente ucranianos, o que iria envolver custos significativos, e provavelmente se abriria um front de insurgência contra a ocupação. Portanto parece que, se – e esse é um grande “e se” – Putin seguir o caminho da ação militar, a rota mais provável seria criar um corredor terrestre unindo o Donbass com a Criméia.
As outras motivações de Putin seriam claramente inflamar o grande poder do nacionalismo russo em uma tentativa de distrair as pessoas dos problemas dentro de casa. Por muitos anos, Putin foi capaz de surfar na onda de um boom econômico petrolífero, e suas taxas de aprovação se mantinham em torno de 70%. Isso aumentou para cerca de 85% utilizando o clima jingoísta seguido da anexação da Criméia. Contudo, sua popularidade novamente voltou a cair, despencando para até 50% em 2020 – e até menos em algumas pesquisas.
Isso se dá graças a uma série de fatores. A pandemia matou cerca de 320 mil russos, de acordo com os números oficiais. Com a queda do preço do petróleo na sequência da crise de 2008, a economia russa também entrou em dificuldades. Isso significa que, de 2013 para 2020, o rendimento real caiu 11%. Além disso, a inflação vem se mantendo em mais de 8%, portanto arrastando os padrões de vida da classe trabalhadora cada vez mais pra baixo. Esse foi o real motivo para os protestos que foram engatilhados pela prisão de Navalny ano passado, e pelo decepcionante resultado eleitoral da Rússia Unida de Putin.
Parte da motivação, portanto, é provavelmente uma tentativa de reacender esse espírito nacionalista reacionário mais uma vez com o objetivo de abafar esse ódio de classe ascendente na sociedade russa. Porém agitar o nacionalismo ameaçando uma guerra é uma coisa completamente diferente de se engajar de fato em uma guerra longa e custosa, que poderia ter um efeito oposto. Essa é outra razão do porquê uma invasão militar em larga escala é altamente improvável, afinal não seria do interesse de Putin.
A fraqueza dos EUA
Em resposta à Rússia, os representantes do imperialismo norte-americano não ofereceram muito mais do que palavras. Jen Psaki, o Secretário de Imprensa da Casa Branca, rejeitou as demandas russas, explicando que eles “não irão comprometer os princípios chave em que a segurança europeia está constituída”. Antony Blinken, secretário de Estado dos EUA, declarou que os EUA estão “preparados para responder com força a novas agressões russas”.
Contudo, em uma investigação mais aprofundada, essa resposta com força se refere apenas a “duras medidas econômicas”, “material defensivo adicional aos ucranianos” e uma promessa de “fortalecer os nossos aliados da Otan nos flancos orientais”. Igualmente, enquanto Jens Stoltenberg, o secretário geral da Otan, declarou que “nós temos tropas, nós temos forças”, ao mesmo tempo não deu nenhum detalhe sobre o que especificamente poderia ser feito. Joe Biden também apontou que comprometer as forças norte-americanas para defender a Ucrânia “não está na mesa”!
O enfraquecimento relativo do imperialismo norte-americano, nesse caso exposto pela sua falta de disposição de comprometer tropas terrestres, o leva a recuar, o que novamente incrementa sua fraqueza. Em uma conferência à imprensa em 19 de janeiro, Biden apontou que seu “palpite” é que Putin “iria entrar”. Todavia, ele acrescentou que a resposta do ocidente dependeria “do que [a Rússia] fará. Uma coisa seria se houvesse uma pequena incursão, e então nós [Otan] acabaríamos tendo uma discussão sobre o que fazer e o que não fazer”.
Do ponto de vista do imperialismo norte-americano, as divisões com seus aliados europeus não devem ser expressas abertamente. Entretanto, devido à fraqueza dos Estados Unidos, eles não estão em condições de forçar uma frente única daOtan com o objetivo de confrontar a Rússia. Isso também foi demonstrado pelo presidente francês, Emmanuel Macron, que recentemente clamou por negociações separadas lideradas pela Europa com a Rússia.
Os EUA estão claramente preocupados em serem expostos como fracos na frente do mundo inteiro, e esse seria o motivo de alguns setores da classe dominante estarem mais inclinados a uma posição mais intransigente. Porém existem limites no que realmente se pode fazer. Após duas guerras punitivas no Iraque e no Afeganistão, há agora uma oposição em massa contra a guerra nos Estados Unidos. O que tudo isso reflete é o declínio relativo do imperialismo norte-americano, que não é mais capaz de agir como uma polícia mundial da mesma forma que fazia no passado. Ele é menos capaz de forçar seus aliados a agirem como um só, e abriram-se espaços para que poderes menores possam manobrar e flexionar seus músculos em escala regional.
Sanções
Os EUA e a Otan foram obrigados a se apoiar em mais sanções. Discussões foram se alternando entre excluir a Rússia do sistema de pagamento da SWIFT [Sociedade para Telecomunicações Financeiras Interbancárias Globais, NdT], o que iria dificultar a habilidade do país de agir no mercado mundial; entre bloquear a importação de bens como smartphones e partes de automóveis; ou mesmo demolir o gasoduto Nord Stream 2, que irá transportar o gás russo diretamente da Rússia para a Alemanha, passando pela Ucrânia.
O problema com essa abordagem é que, se a Rússia realmente pretender invadir a Ucrânia, as sanções não seriam o suficiente para impedi-la. Primeiro de tudo, enquanto as sanções são estimadas em atingir a economia russa entre 2,5% e 3% por ano, elas não atingirão o que foi pretendido. Muitas dessas sanções foram impostas logo após a anexação da Criméia, porém elas não fizeram nada para forçar Putin a reverter a anexação.
Além disso, conforme o Financial Times explica, o Estado russo tem feito esforços para reduzir sua dependência do sistema financeiro global. O que isso significa é que as sanções poderiam na verdade atingir a União Europeia (EU) ainda mais forte do que a Rússia. A UE importa mais de 40% do seu gás e ¼ do seu petróleo da Rússia, então barrar o país de utilizar o sistema de pagamento da SWIFT, ou encerrar o Nord Stream 2 – especialmente no contexto da elevação do preço do gás – são medidas provavelmente intragáveis para os líderes da União Europeia.
Isso é particularmente verdade para a Alemanha, o principal país capitalista na Europa, e o país que é mais economicamente dependente da Rússia. Por essa razão os capitalistas alemães não desejam as sanções, e Berlim tomou uma posição que é notavelmente menos beligerante do que a de Washington. O chefe da Marinha Alemã foi forçado a renunciar por expressar isso publicamente, quando ele disse que o status da Criméia não seria revertido e que o que Putin deseja “e provavelmente merece” era “ser tratado com respeito”. Em uma entrevista com o jornal Sueddeutsche Zeitung, o chanceler da Alemanha, Olaf Scholz, disse que quaisquer sanções impostas à Rússia, no caso dessa invadir a Ucrânia, devem ser “prudentes” pois “ninguém deve nutrir a ilusão de que existe qualquer medida que não tenha consequências para nós”. Tudo isso em um momento em que Washington deseja que seus aliados europeus lidem com a Rússia para que os EUA possam se concentrar na China.
Além do que, sobre bloquear as importações russas de tecnologia, levaria apenas a certos países estando dispostos a violar tal bloqueio, tornando todo esse procedimento totalmente ineficaz. Os EUA podem tentar bloquear os smartphones ou qualquer coisa que eles desejem de entrar no mercado russo, porém podemos imaginar facilmente que a China estaria disposta de dar um passo à frente para preencher essa lacuna.
Um acordo pode ser alcançado?
Agora a questão está colocada: o que acontecerá? O principal objetivo dos EUA, de acordo com o Conselheiro de Segurança Nacional, Jake Sullivan, é de “dissuadir uma invasão militar russa em ainda mais territórios ucranianos”. O imperialismo norte-americano gostaria de manter o controle sobre o Leste Europeu, porém, para poder focar sua atenção na China, está se abstraindo da Europa e do Oriente Médio. Isso abre uma oportunidade para a Rússia empurrar de volta o que ela vê como um avanço ameaçador do ocidente.
Os EUA não estão dispostos a usar tropas para defender a Ucrânia militarmente, e as sanções não serão o suficiente para forçar Putin a recuar, o que significa que eles serão forçados a realizar mais concessões. Já existem murmúrios sobre isso. Conforme o The Economist aponta, a citação acima de Sullivan deixa aberta a possibilidade de permitir a Rússia anexar as regiões separatistas da Ucrânia. Também existem conversas de que os EUA estão considerando uma redução de suas forças no Leste Europeu. Isso foi negado por Biden, no entanto Antony Blinken foi ambíguo quando perguntado na CNN sobre o posicionamento de artilharia pesada na Polônia. Outros, como um ex-diretor sênior para a Rússia do Conselho de Segurança Nacional, sugeriu que a Otan poderia comprometer-se formalmente a prevenir a Ucrânia de se juntar à Otan por um período definido de anos.
Junto com a gama de sanções, a Otan está preparada para oferecer algumas concessões sobre “controle de armas” e fazer esforços para uma maior “transparência de atividade militar”. Similarmente, um alto funcionário da Casa Branca revelou que os EUA estão dispostos a “explorar… restrições recíprocas sobre o tamanho e o escopo dos exercícios [militares]”. Isso foi desmentido por Sergei Ryabkov, o negociador russo, que disse que as negociações alcançaram um “beco sem saída”, desde que essas concessões não atenderam às principais exigências do Kremlin. Em outras palavras, os russos sentem que podem conseguir concessões ainda maiores.
Na recente conferência à imprensa seguida do fracasso das negociações com Ryabkov, Biden expôs as mais recentes ideias sobre concessões que podem ser oferecidas. De acordo com o presidente, os dois desejos mais importantes da Rússia são de que a Ucrânia “nunca seja parte da Otan” e de que “nenhum armamento estratégico deve ser instalado na Ucrânia”. Sobre a segunda demanda, ele disse que “algo poderia ser trabalhado nesse sentido”. Sobre a questão da Ucrânia se juntar à Otan, ele apontou que “no curto prazo” isso “não seria muito provável”, significando então que “há espaço para trabalhar se ele estiver disposto a isso”. Ele também apontou que uma conferência com Putin era “uma possibilidade”.
A Rússia não recuar diante das sanções e os EUA não estarem dispostos a se comprometer em defender a Ucrânia militarmente já é uma vitória para a Rússia e para Putin. Isso foi claramente demonstrado pela reunião entre Blinken e Lavrov em 21 de janeiro. Biden está agora sendo descrito como “totalmente preparado” a se comprometer em conversações com Putin. Putin, por outro lado, parece estar disposto a deixar Biden cozinhando, com Lavrov dizendo que as conversas futuras dependerão de “sérias preparações”. Conseguir uma conferência com o presidente dos EUA já é uma vitória por si só para Putin.
O curso mais provável dos eventos, portanto, é de prosseguimento das conversações entre os EUA e a Rússia, eventualmente levando os EUA a serem forçados a algum tipo de concessões. Pequenas incursões da Rússia não podem ser descartadas, mas uma invasão em escala-total na Ucrânia é extremamente improvável. Os EUA tentarão manter as concessões que fizerem atrás das cortinas e pintar o que quer que ocorra como uma vitória. Contudo, o que tudo isso mostra é que os EUA certamente não estão “de volta”, e Putin, completamente ciente desse fato, está tomando total vantagem da situação.
A situação na Ucrânia reflete a situação mundial. Quando o sistema capitalista está em um período de crescimento geral, e tem pilhagem o suficiente para ser compartilhada entre as diferentes classes capitalistas, o sistema pode aparentar estabilidade. Quando o sistema está em crise, entretanto, cada estado nacional tenta reivindicar os interesses de sua própria classe dominante com cada vez mais força, levando a mais atritos e surtos, como esse que estamos testemunhando. Isso é composto pela crise do imperialismo estadunidense, que não pode mais ditar as regras das relações mundiais como costumava fazer para estabilizar a situação. Pelo contrário, ele está se tornando uma força desestabilizadora por si só. Essa crescente instabilidade é a marca do período em que nós vivemos. É o reflexo de um sistema doente.
TRADUÇÃO DE JOÃO LUCAS BRANDÃO.
PUBLICADO EM MARXIST.COM
Tags Biden EUA Guerra Putin Russia Ucrânia UE
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